Diego Pupe, o antigo assessor de Jair Renan Bolsonaro, em depoimento à Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), na quinta-feira, 14, declarou que manteve um relacionamento “amoroso e
romântico” com o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Em entrevista ao Metrópoles, Pupe confirma que, até então, não tinha falado para ninguém. Nas redes, o filho “04” rebateu afirmando que se um dia fosse visto “agarrado com um macho, pode ter certeza que é briga”.
Enquanto estava no X, antigo Twitter, já me deparei mais de uma vez com a frase “homens que amam outros homens”, não no sentido homossexual, mas inserido em uma lógica heterossexual homoafetiva. Se não olhar no olho pode, né?
Dizer que um homem é heterossexual implica somente que ele mantém relações sexuais exclusivamente com o sexo oposto - mulheres. Tudo ou quase tudo que é próprio do amor, a maioria dos homens héteros reserva exclusivamente para outros homens - segundo Marilyn Frye, filósofa.
Entendeu a lógica? As pessoas que eles mais admiram, respeitam, adoram, imitam, idolatram, aqueles com quem criam vínculos mais profundos, a quem estão sempre dispostos a aprender, aqueles cujo respeito, admiração, reconhecimento e amor eles desejam. A cultura heterossexual masculina é homoafetiva, ela cultiva afetos por homens.
Mas, se assim é, por que fazem um esforço brutal para afastar dos homens qualquer questão relacionada a homossexualidade? Por que sempre usam termos “do mundo gay” ou relacionados à temática de forma pejorativa para se referir reciprocamente? Questionar a sexualidade de um homem é mais grave do que questionar seu carácter. Heterossexualidade acima de tudo, sigilo acima de todos.
O caso do assessor, para além dele, mostra o que nunca foi obscuro. Pupe sai de cena, a questão agora é o filho “04”. Pelos comentários: “Nunca desconfiei desse daí. Pai homofóbico, filho gay”; “Não queremos ele na sigla LGBT”; “Iiiih o mito deu uma fraquejada!”.
A humanidade está marcada pelo ‘falocentrismo’, logo, a maior quantidade de comentários também se relaciona com essa lógica, “quem queima a rosca e quem fica por cima?”. E, se tratando disso, ainda existe uma inferiorização, seguida de feminilização das pessoas que preferem a passividade.
Sodomia. Em Gênesis 19 vemos um relato não meramente de prática de sexo anal, mas de violento estupro coletivo, pois os habitantes de Sodoma eram extremamente hostis, violentos e depravados. Mais tarde, a fim de atribuir esses significantes, o adjetivo pátrio “sodomita” foi associado ao ato do sexo anal e da homossexualidade.
Em Ezequiel 16:49-50, os pecados dos sodomitas eram muitos, falta de hospitalidade, avareza, injustiça, falta de misericórdia, prostituição… No entanto, o principal pecado atribuído ao adjetivo ‘sodomita’ era a imoralidade, depravação sexual e relações antinaturais. Em Romanos 1:26-29, o apóstolo Paulo condena a prática da sodomia, com mais ênfase a passividade sexual masculina.
Renan Bolsonaro, filho 04, falou abertamente, em podcast disponível na internet, sobre punheta e comer ‘mina’, além do grande ‘caso da camisinha’ que repercutiu nas profundezas do X em 2020. Mas quem deveria ser destruído pelo dilúvio devido à ‘promiscuidade sexual e libertinagem’ são as pessoas da comunidade LGBTQIAPN+.
Na Grécia Antiga, o relacionamento homossexual era considerado uma prática pedagógica. A ação tinha o objetivo de transferir conhecimentos de ordem filosófica, política e militar. Perceba que não é pelo fator prazer, mas o fator viril. Um macho que transa com outro macho, desprende-se da obtenção do prazer erótico, torna-se uma briga de falos.
Por que dei esse título e o que é “brotheragem”? Em uma sistematização, é quando dois "brothers" (irmãos) decidem se “satisfazer”. Regras: não pode ter sentimento e nem pode olhar no olho. Um pacto silencioso que os mantém reféns uns dos outros.
Ora, se um homem hétero – que seria condenado por ter comportamentos homossexuais – encontra outro hétero sujeito à mesma ameaça, o pacto entra em ação. Eles ficam juntos, praticam sexo, realizam seus desejos homossexuais e, como numa aliança social bilateral para manter o perfil social hétero de ambos e seguirem aceitos nos grupos em que frequentam, pactuam que nenhum contará sobre o outro.
Se tratando de subjetividade de uma masculinidade mal construída, posso citar diversos exemplos aqui, que se resumem em: “Olha aqui como eu sou homem, eu gosto mesmo é de mulher!”. Porém, poucos percebem que ser dotado de elementos que dificultem que alguém lhes veja como não heterossexual, não passa de uma caricatura, ou melhor, performance - como diria Butler - sobre o que é ser homem.
O poço de seus desejos e medos é profundo que podem chegar a se afogarem a cada movimento. São seres profundamente fechados em suas carências e obsessões másculas. O peso que as socialização masculina exerce sobre a própria sexualidade dos sujeitos.
Não me interessa o que Renan Bolsonaro é, não esqueçamos o que ele e seu pai fizeram, não merecem empatia. Brotheragem, ou como héteros sigilosos queiram chamar, é o nome dado ao desejo dos homens de viver sua sexualidade, mas que para não perder o lugar no privilégio se submetem a um dos maiores sofrimentos: negar quem podem ser e o que podem sentir.
Um fluido ensaio com ideias límpidas e juízos claros.